segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Paradigma de Uma Sociedade Anti-Vida e o Passeio Socrático

Ando um pouco afastado do blog, porém vou continuar deixando algumas mensagens. Muitos dos assuntos abordados são um tanto repetitivos, embora importantes, servindo para despertar reflexões em um pequeno número de pessoas sobre o comportamento da grande massa dominada física e espiritualmente pelos  paradigmas do atual sistema capitalista predador anti-vida.

Também não podemos esperar que em questão de meses uma grande revolução silenciosa surja espontaneamente em todos os quadrantes da nossa espaçonave Terra.

Um movimento histórico de mudanças no comportamento predador da sociedade humana sobre a biodiversidade pode levar dezenas de décadas para se concretizar.

Por essa vertente, já se vêem alguns movimentos tímidos esboçando seus ideais para uma mudança drástica, revelando verdades ocultas para a grande massa e atacando paradigmas inquestionáveis do sistema capitalista. Entre esses movimentos cito apenas um como exemplo: Movimento Zeitgeist.

Uma coisa é importante observar: temos pouco tempo para mudanças, as quais devem de ser radicais e, além do mais, a nossa espaçonave Terra vem sofrendo uma espécie de “efeito dominó” climático e a extinção de milhares de espécies essenciais para a vida. Esses efeitos em parte são proporcionados pelo atual comportamento deletério imposto pela doutrina capitalista sob o comando de poucas famílias, ou deveria de dizer da Corporatocracia, além da corrupção generalizada de milhares de agentes políticos em todo o mundo que servem a esses senhores.

Por meio desse sistema demoníaco, bilhões de seres humanos estão sendo excluídos ou simplesmente exterminados através de mecanismos modernos bem mais sutis do que os métodos engendrados pelos antigos lideres extremistas de esquerda e de direita, a exemplo do nazismo.

Esse mesmo capitalismo excludente para milhares de seres humanos, nega até mesmo um simples prato de comida e um pouquinho do bem mais precioso e raro da Terra, ou seja, a água potável, a qual é essencial para a continuação da vida. Esse sistema está levando milhões de seres ao extermínio e a extinção dos bens não renováveis do planeta pelo consumismo desordenado e patético, o qual vai muito além das necessidades reais de um ser humano.

Os recursos que a espaçonave Terra oferece daria ainda para dezenas de séculos e para todos os seus habitantes, desde que fosse escutada a voz da razão e a ganância pelo lucro e poder fossem amainados pelo atual sistema capitalista.

Outrossim, a concentração de rendas nas mãos de um pequeno grupo de capitalistas, ou deveria dizer, da Corporatocracia chega a um patamar nunca vista na história humana, graças ao consumismo exacerbado que controla a grande massa pelo lado emocional e não pela razão, impulsionando essa população na busca frenética de uma felicidade ilusória e de curta duração.

E para piorar, a automatização tecnológica está tirando milhões de empregos, no mundo inteiro, o que vem gerando mais lucros para os verdadeiros donos do poder planetário. As conseqüências sociais já são sentidas em várias partes do mundo, principalmente nos grandes centros urbanos, nos quais o caos vai se generalizando através da violência.

Porém, apesar da espada de dâmocles estar pairando, perigosamente, sobre a humanidade, ainda temos uma tênue esperança de que surja um controle democrático por meio de um capitalismo mais humanista, onde o lucro seja a preservação da biodiversidade planetária, que coloque ordem nesse consumismo desenfreado e faça com que as pessoas despertem para a realidade da vida e da verdadeira felicidade em toda a sua magnitude e não da anti-vida em que a grande maioria está imersa atualmente.

E para encerrar deixo para os interessados um artigo do Frei Betto, o qual foi bem iluminado ao escrevê-lo, além de servir para se fazer uma grande reflexão do tipo de modelo alienante imposto aos seres humanos e o que realmente queremos para o futuro dos nossos filhos e filhas.

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PASSEIO SOCRÁTICO

Carlos Alberto Libânio Christo¹



Ao viajar pelo Oriente mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos e em paz nos seus mantos cor de açafrão.

Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente.

Aquilo me fez refletir: 'Qual dos dois modelos produz felicidade?' Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não, tenho aula à tarde'.

Comemorei: 'Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho tanta coisa de manhã...'. 'Que tanta coisa?', perguntei.. 'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula de meditação!'

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados. Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'. 'Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa? Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual.. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual. Somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. E somos também eticamente virtuais...

A palavra hoje é 'entretenimento'. Domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este refrigerante, calçar este tênis, usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá!' O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose. O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista.

Assim, pode-se viver melhor.. Aliás, para uma boa saúde mental, três requisitos são indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shoppings centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas....

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno...

Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do Mc Donald...

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: 'Estou apenas fazendo um passeio socrático. Diante de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia: "Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz!".

¹Frei Betto, escritor e assessor de movimentos sociais.