terça-feira, 6 de maio de 2008

DENGUE EM BOA VISTA


- Em 2002 eu e minha família contraímos o vírus da dengue e somos passiveis agora de contrairmos a dengue hemorrágica. As chances de ocorrer, infelizmente, estão a
aumentar em Boa Vista com a chegada do inverno que promete ser rigoroso.

- As autoridades municipais e estaduais estão preocupadas com a possibilidade de ocorrer uma epidemia e, de acordo com o que é publicado na mídia, estão tomando as providências necessárias para que a situação não chegue ao ponto em que chegou a cidade do Rio de Janeiro por falta de atuação governamental.

- Acredito que a realidade seja um pouco diferente, pois em frente a minha residência, existe um terreno baldio enorme que vem a dez anos gerando conflito de vizinhança. Algumas pessoas, inconscientes do desastre que se aproxima, jogam lixo no local. Não é necessário ter uma bola de cristal para prever o futuro. É só deixar tudo como está.

- É exatamente isto que está ocorrendo, pois o respectivo terreno está cheio de lixo e mato e além do mais fica praticamente no centro de Boa Vista. É inacreditável que as autoridades municipais de outras gestões não tenham tomado as providências legais amparadas em legislação municipal, estadual e federal.

- Preocupado com a possibilidade de surgir casos de dengue no bairro onde resido, tomei a providência de encaminhar para o Exmo. Sr. Prefeito Municipal de Boa Vista informações sobre a situação do local onde residimos, inclusive assinado por oito munícipes residentes próximos ao terreno baldio em questão.

- Para que fique registrado neste blog, reproduzo abaixo o teor do respectivo documento encaminhado para o Sr. Prefeito municipal no dia 5/5/2008.

- Espero que as providências legais, coercitivas ou não, sejam tomadas o mais rápido possível, antes que ocorram casos de dengue hemorrágica entre os nossos vizinhos e com possibilidades de ocorrer óbitos, principalmente entre crianças por serem as mais susceptíveis.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR PREFEITO DO MUNICÍPIO DE BOA VISTA PREFEITURA MUNICIPAL DE BOA VISTA - ESTADO DE RORAIMA




- Munícipes residentes à Rua Cristóvão Coelho, entre a Av. Ataide Teive, Mário Homem de Mello e adjacências vêm, com proverbial respeito, à presença de Vossa Excelência para comunicar e solicitar às providências com a máxima urgência para os fatos a seguir aduzidos:

DOS FATOS

a) Na Rua Cristóvão Coelho, entre a Av. Ataíde Teive e Mário Homem de Mello existem dois terrenos, os quais não estão coadunando com a lei orgânica municipal, afetando a segurança, o sossego, a saúde dos proprietários contíguos, em desconformidade com a função social, a qual realmente deveriam se destinar. Um dos terrenos é baldio, sendo que sua localização fica entre a residência de nº 704 e o estabelecimento comercial Edir Bar Lanches. O outro terreno possui uma casa antiga de nº 311, localizado entre as residências de nº 663 e 635.

b) No ano de 2002 foi solicitado, diversas vezes por escrito, à prefeitura municipal para que fosse pressionado o proprietário do terreno baldio, com o intuito de forçar a devida profilaxia da área, pois a mesma possuía uma grande quantidade de lixo acumulado durante anos e várias carcaças de ônibus. A prefeitura, de acordo com um ofício recebido por um morador, julgou-se incapaz para a retirada das carcaças de ônibus, mas iria providenciar a limpeza. Infelizmente, pela demora da retirada do lixo e das respectivas sucatas de ônibus do terreno baldio, várias pessoas contraíram a dengue, pois o local estava, comprovadamente, infectado pelo mosquito transmissor da doença. A denúncia também foi matéria veiculada no jornal A Folha de Boa Vista. Após a disseminação da dengue, a limpeza forçada foi executada pelo proprietário, mas as carcaças de ônibus permaneceram no local.

c) Com a impossibilidade do Poder Público Municipal em solucionar o problema, que na época já perfazia mais de oito anos, a pedido dos moradores, houve a intervenção do Ministério Público, o qual prontamente conseguiu pressionar o proprietário para a retirada dos ônibus sucateados que, comprovadamente, serviam de berçários das larvas do Aedes aegypti. Até a retirada das sucatas passaram-se mais dois anos, perfazendo um total de dez anos. De qualquer maneira, foi uma vitória da cidadania e dos moradores das áreas adjacentes graças à magnífica intervenção do Ministério Público Estadual.

d) O terreno baldio permaneceu limpo por um bom período, mas com a falta de manutenção, e desinteresse do proprietário, algumas pessoas alheias ao esfacelamento ambiental global, egoístas, individualistas, sem condições de viverem em coletividade e com falta de princípios norteadores de cidadania estão a colocar lixo degradável e, o pior de todos os detritos, o lixo não degradável. Com o lixo acumulado, o aumento da população de insetos e roedores é praticamente inevitável.

e) Recentemente, no mês de março de 2008, algum desocupado, ou talvez possuidor de uma visão profilática frágil, colocou fogo no matagal da área, o qual trouxe perigo real e imediato para várias residências e principalmente para a residência de nº 704, já que o fogo estava a atingir o respectivo imóvel.

f) Convém frisar que, com o anunciado inverno rigoroso, os riscos irão aumentar consideravelmente, pois várias pessoas das áreas adjacentes foram contaminadas no ano de 2002 com o vírus da dengue (DEN 1). A partir deste fato, aqui registrado, existe a possibilidade de se contrair a forma mais cruel da doença, ou seja, a dengue hemorrágica, a qual poderá levar pessoas a óbito, e, entre as quais, as crianças por serem às mais vulneráveis.

g) De nada adiante o Agente Comunitário de Saúde visitar as residências adjacentes da área, com o intuito de verificar a existência de larvas do mosquito transmissor, pois o foco maior é exatamente o terreno baldio e o terreno em frente ao mesmo, os quais, pelo visto, não sensibilizou a autoridade designada pela poder público municipal de outras gestões municipais, para a fiscalização contínua e as devidas providências legais previstas em lei federal, estadual e municipal.

h) Outro fato agravante é que o morador da residência de nº 635 já coletou exemplares do mosquito adulto Aedes aegypti em sua propriedade, na data de 24/04/2008. Como o mosquito se desloca até aproximadamente 300 metros, é obvio que existe algum criadouro nas adjacências, o qual merece a devida atenção imediata das autoridades.

i) Fugit irreparabile tempus, para o saneamento preventivo intenso, pois o desastre da contaminação da DEN 1, DEN 2 e DEN 3 se avizinha com a possibilidade de ocorrer a disseminação da DEN 4, já que a mídia (Folha de Boa Vista – 31/03/2008) divulgou matéria da existência do vírus em Manaus e Venezuela.

DO FUNDAMENTO

- Tendo em vista os fatos expostos, passamos a expor, sucintamente, para a sua apreciação, alguns fundamentos legais relacionados com os riscos que os moradores da área crítica e adjacências estão sendo submetidos indevidamente.

- Nos termos da Constituição Federal, art. 225, caput é previsto, que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

- A nossa Carta Magna ainda descreve o direito à saúde como direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (CF, art. 196).

- Podemos também concluir que os direitos individuais não são mais considerados exclusividade do cidadão, mas apenas instrumentos para a realização do coletivo. O art. 5º, XXIII da CF/88 deixa o direito de propriedade atrelado a sua função social.

- Transcrevemos o artigo em questão:

“Art. 5º. Omissis.

XXII – é garantido o direito de propriedade;

XXIII – a propriedade atenderá a sua função

social;”

- O artigo 182, § 2º, da mesma Constituição, ressalta que a propriedade, na sua função social, deve atender exigências necessárias para a ordenação da cidade, as quais estiverem discriminadas num plano diretor.

- O art. 1.228, § 1º da Lei nº 10.406/2002 (Novo Código Civil) se refere ao direito à propriedade. Aduz que “de acordo com suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”.

- Outrossim, as pesquisas cientificas confirmam que a dengue é uma moléstia polimorfa de caráter infecciosa aguda, com um quadro clinico variável, cuja transmissão é feita por contágio indireto por inoculação viral de um arbovírus do gênero flávirus da família Flaviridae, da qual esta comprovada a existência de quatro sorotipos virais: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. A transmissão da dengue pode ocorrer através de vários mosquitos contaminados do gênero Aedes. No território brasileiro já esta comprovada à existência de duas categorias: Aedes aegypti e Aedes albopictus. A presença de espécies de Aedes contaminados pode gerar em humanos formas sintomáticas ou assintomáticas, que estará a causar em suas vítimas cefaléia, mialgia, artralgia e febre exantema com possiblidades, em caso de reinfecção, de ocorrer casos graves de febre hemorrágica, choque hipovolêmico e óbito. O grupo mais susceptível para as formas graves são os infantes com menos de 15 anos, embora possa ocorrer em todas as idades.

- É notório que a dengue e o Aedes aegypti estão instaladas nas cidades de quase todo o território nacional, principalmente nos grandes e médios centros urbanos. A falta de medidas preventivas está a provocar a deterioração da qualidade de vida e, principalmente da saúde das populações desses centros urbanos. Em algumas cidades existe o total fracasso do controle da população do gênero Aedes, principalmente por descaso municipal, bem como da própria população mal preparada para a devida profilaxia de suas propriedades. Como exemplo, temos a cidade do Rio de Janeiro envolvida em um quadro de epidemia explicita com milhares de contaminados e dezenas de óbitos. Em outras cidades, o quadro é oposto, pois esta ocorrendo à prevenção educativa através de medidas preventivas e até mesmo repressivas com a prisão de pessoas que não cooperam com as autoridades.

- O prejuízo é obvio. A saúde e o bem estar das pessoas vêm decaindo em progressão geométrica em muitas cidades brasileiras por descaso governamental, consubstanciado com atitudes ignaras do próprio povo.

- O código de Posturas da Comarca de Boa Vista, em seu Art. 136, é enfático quando faz a explanação de se evitar que os terrenos baldios existentes causem transtornos aos munícipes em razão de ser responsabilidade do proprietário a sua limpeza e manutenção, de forma a mantê-los livres de quaisquer materiais nocivos à saúde dos vizinhos limítrofes e da coletividade em geral.

- Transcrevemos o supracitado artigo:

Art. 136. Os terrenos situados na área urbana deste Município deverão ser mantidos limpos, capinados e isentos de quaisquer matérias nocivas à saúde da vizinhança e da coletividade.

§ 1º. A limpeza de terrenos deverá ser realizada pelo menos duas vezes por ano.

- Em 1974, a Lei nº 18/74 de 21 de agosto de 1974, deixava visível a preocupação com o lixo que poderia ser depositado em terrenos baldios da capital:

Art. 137 – É proibido depositar ou descarregar qualquer espécie de lixo, inclusive resíduos industriais, em terrenos localizados nas áreas urbanas e de expansão deste Município, mesmo que os referidos terrenos não estejam devidamente fechados.

§ 2º - O infrator incorrerá em multa, dobrada na reincidência.

§ 3º - A multa será aplicada, pela mesma infração e idêntico valor, a quem determinar o transporte e depósito de lixo ou resíduos e ao proprietário de veículo no qual for realizado o transporte.

- Do exposto, fica obvio a inobservância de normas de proteção à saúde pública pelos proprietários que não se preocupam com a limpeza e de algumas pessoas ignaras que insistem em jogar lixo nos dois terrenos supracitados.

- Muito terá que ser feito para educar o povo, onde a maioria não tem a consciência exata da dimensão do perigo eminente.

- Enfim, não resta a menor dúvida: existe a necessária intervenção do poder municipal, com a finalidade precípua de que sejam evitados maiores riscos ao bem-estar e à saúde, inclusive com possibilidade de que ocorram óbitos de munícipes das áreas críticas e adjacências por reinfecção através do gênero Aedes.

DO PEDIDO

- É sábio lembrar que o Poder Público Municipal é o que está mais intimamente ligado aos problemas urbanos e com a tarefa precípua de solucioná-los adequadamente em consonância com as leis federais e municipais.

- Isto posto, e sem logomaquia, solicitamos e sugerimos o seguinte:

a) as providências com a máxima urgência por parte do poder público municipal através das secretárias responsáveis pela saúde, controle ambiental e órgãos correlatos, com a finalidade precípua, de que sejam tomadas as medidas profiláticas e a devida limpeza dos dois terrenos, por meios legais coercitivos ou não, para que sejam preservados o bem-estar e a saúde dos munícipes neste pequeno recanto da urbe, bem como a retomada da função social das propriedades em questão, mesmo contra a vontade dos proprietários, pois, infelizmente, muitos visam apenas à especulação imobiliária.

b) Tendo em vista a possibilidade eminente de que a situação se agrave, sugerimos que seja feita uma relação dos terrenos baldios, não apenas dos terrenos supracitados, mas de todos os terrenos baldios da nossa cidade, bem como o controle da limpeza dos mesmos, já que muitos deles, a décadas, estão contrariando a verdadeira função social. Estão a adversar o Direito de Vizinhança, bem como as normas pertinentes à Vigilância Sanitária prescrita em lei federal, estadual e municipal.

Boa Vista, Roraima, 23 de abril de 2008.

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