sábado, 3 de maio de 2008

A RESPONSABILIDADE SOCIAL UNIVERSITÁRIA, UMA SAÍDA PARA A MÁ QUALIDADE

- A poucos meses um menino de oito anos conseguiu aprovação em uma universidade privada de Goiânia. Super dotado? Nem tanto. Existem exemplos comprovados de universitários, que possuem dificuldades de interpretação de simples textos, leitura e demonstram ainda a falta de domínio na escrita. Eles fizeram o exame seletivo em Instituições de Ensino Superior (IES) e, apesar do alto grau de deficiências, muitos foram aprovados. As conseqüências nefastas vão surgindo após o término do curso. Na área do Direito, a OAB denunciou em 2007 a péssima qualidade de ensino jurídico no País, em parte pela proliferação de faculdades de Direito que chegavam a 1.077 estabelecimentos. Na área da Saúde os erros crassos mostram a deficiência de muitos enfermeiros e médicos mal preparados para o mercado. Em outros cursos universitários a situação não é melhor.

- É perfeitamente compreensível da necessidade de se manter uma boa saúde financeira em uma Instituição Ensino Superior (IES), mas a acumulação descabida de capital gerada pela comercialização de serviços educacionais não deveria de ser o fim máximo. O lucro exacerbado de muitas Instituições de Ensino Superior (IES), alunos oriundos de um péssimo Ensino Médio fracassado, corrupção acentuada, valores sociais em baixa, professores mal preparados e com baixos salários deixam transparecer uma realidade perigosa para o futuro de uma Nação e dos próprios universitários.

- A correção desses vícios enraizados irá levar décadas para serem erradicados e dependerá de muita vontade política para a condução da educação que, infelizmente, não foi o ponto forte da tríade governamental Collor/FHC/Lula e isto sem falar de outros governos. Foram décadas perdidas.

- Uma alternativa essencial para ocorrer mudanças expressivas seria fortalecer a discussão da Responsabilidade Social Universitária (RSU). A Responsabilidade Social Universitária corretamente aplicada trará novos ares não somente aos ambientes universitários predatórios e mercantilistas, mas a todos aqueles abertos às mudanças essenciais educacionais de extrema necessidade. (Calderón, 2000).

- O término de uma faculdade nos dias atuais já não significa mais a garantia de um bom futuro financeiro e neste sentido as Instituições de Ensino Superior (IES) deveriam de proporcionar mudanças drásticas na condução do curso escolhido pelo acadêmico, pois o sucesso financeiro e profissional dele estará atrelado ao caráter, a criatividade, a motivação e, principalmente, a persistência. Essas características também formam a base para a formação de lideranças éticas e responsáveis que irão influenciar no desenvolvimento de uma sociedade mais humanizada e holística. Quantas universidades estarão realmente preparadas para transmitir tais características? Poucas, isto sendo otimista.

- Nesse sentido, a Responsabilidade Social Universitária (RSU), poderá transmitir valores essenciais para o aprendizado do acadêmico mediante a observação e experiência própria. Os universitários seriam incitados a pensar por si mesmos, teriam condições de fortalecer os seus ideais e teriam condições de descobrir a realidade de um mundo que possui mais de um bilhão de seres humanos miseráveis, sendo que mais de 815 milhões são pessoas desnutridas, além de outros horrores dignos dos filmes de ficção. Vejam que esses números estão a crescer em todo o planeta a cada minuto.

- Para o ilustre corifeu François Vallaeys (2006),

a Responsabilidade Social Universitária exige, a partir de uma visão holística, a articulação das diversas partes da instituição, em um projeto de promoção social de princípios éticos eqüitativos e sustentável, com vistas à produção e transmissão de saberes responsáveis e à formação de profissionais cidadãos igualmente responsáveis.

- Partindo do pensamento acima, a participação dos acadêmicos junto à indústria, agricultura e educação da região em que a IES estiver localizada seria fator primordial para a pesquisa, além de possibilitar articulações de projetos sociais junto ao povo de periferia para a solução de diversos problemas sociais que os afligem e o aprimoramento de um desenvolvimento sustentável, mas para isto teria que haver interesse do Estado em participar ativamente. Vejam o desinteresse de várias instituições universitárias do Rio de Janeiro e do próprio governo no controle do vírus da Dengue. Essas instituições universitárias poderiam ter criado atividades acadêmicas que estariam lidando com os desafios ou problemas enfrentados pela sociedade de periferia, onde concentra grande parte dos excluídos. Infelizmente, no momento político e social em que estamos imersos a décadas, para muitos acadêmicos universitários, o sucesso no mundo empresarial e pessoal esta atrelado ao suborno e praticas de atos corruptos. Esse pensamento paradigmático falho tem que ser mudado, pois as conseqüências são visíveis em todos os quadrantes do País.

- Essa maneira de pensar de muitos profissionais oriundos de um ensino superior falho, enfraquece a Nação e a população fica imersa em um eterno senso comum imposto por grupos corruptos e midiáticos. Surge até mesmo a possibilidade de fragmentação da Nação, com o surgimento de Novas Nações, principalmente no Norte do País. Vejam que, de acordo com uma pesquisa, em torno de 98% da população viu ou escutou, via midiática, algo sobre o caso da menina Isabela, provavelmente morta pelos seus pais, mas desconhece a pérfida situação social e política imposta para os índios e não índios da Serra Raposa do Sol, encravada no Estado de Roraima e de outras áreas da Amazônia brasileira sujeitas a se transformarem em novas nações independentes para o deleite de muitos países do primeiro mundo.

- Por tudo isto, deveria de se manter um controle mais acentuado na abertura e qualidade de ensino das novas faculdades, uma seleção mais rígida para que se evite que meninos e meninas que ainda estão cursando o fundamental passem nos exames e que tenhamos universitários sem senso critico, que lêem e escrevam parcamente, como se observa em muitas instituições de ensino, incluindo as de nível médio e fundamental. As IES privadas (em torno de 89,83%)1 e as poucas IES públicas (em torno de 10,17%), por sua vez, deveriam de articular medidas diretas proporcionadas pela Responsabilidade Social Universitária com ênfase na dignidade, na liberdade, na integridade, na dimensão social, no bem comum e eqüidade social, no desenvolvimento sustentável, na aceitação e apreço a diversidade, na sociabilidade e solidariedade, na cidadania, na democracia e participação. Tudo isto atrelado à aplicação da transdisciplinariedade para a formação dos novos alicerces na universidade. Somente assim, pela correta educação universitária, é que se poderá gerar lideres dignos, capazes de salvaguardar os interesses de soberania nacional, erradicação de graves problemas sociais, além de preparar adequadamente o futuro profissional do século XXI para um mundo dividido entre os poucos que tem tudo e a grande maioria que não tem nada.

1 - Segundo informações contidas no Informativo nº 136 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira-INEP, órgão do MEC, de 24/5/2006, o país tinha 2.381 IES. Desse total as IES privadas correspondiam a 89,83%. As 10,17% restantes eram IES públicas. É um número assustador, pois praticamente a universidade pública está desaparecendo, além da má qualidade de muitos cursos. O Banco Mundial ministrou e a lição de casa foi bem feita.

- CALDERON, Adolfo Ignacio. Universidades mercantis: a institucionalização do mercadouniversitário em questão. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 14, n. 1, 2000.

- VALLAEYS, François. Que significa responsabilidade social universitária?. Estudos, Brasília, DF, ano 24, mar. 2006.

-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-.-

“A era que virá há de nos mostrar o caos por detrás da lei” (J. A. Wheeler).


“O enfraquecimento de uma percepção global leva ao enfraquecimento do senso de responsabilidade – cada um tende a ser responsável apenas por sua tarefa especializada –, bem como ao enfraquecimento da solidariedade – ninguém mais preserva seu elo orgânico com a cidade e seus concidadãos” (Edgar Morin).


“Não se ensinam os homens a serem homens honestos, mas ensina-se tudo o mais” (Pascal).


“Queremos ser os poetas de nossa própria vida, e, primeiro, nas menores coisas” (Nietzsche).


“O aprendizado da vida deve dar consciência de que a “verdadeira vida”, para usar a expressão de Rimbaud, não está tanto nas necessidades utilitárias – às quais ninguém consegue escapar –, mas na plenitude de si e na qualidade poética da existência, porque viver exige, de cada um, lucidez e compreensão ao mesmo tempo, e, mais amplamente, a mobilização de todas as aptidões humanas” (Edgar Morin).


“A EDUCAÇÃO deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver) e ensinar como se tornar cidadão. Um cidadão é definido, em uma democracia, por sua solidariedade e responsabilidade em relação a sua pátria. O que supõe nele o enraizamento de sua identidade nacional” (Edgar Morin).


" A transdisciplinariedade é uma transgressão da dualidade que opõe os pares binários: sujeito/objeto, subjetividade/objetividade, matéria/consciência, natureza/divino, simplicidade/complexidade, reducionismo/holismo, diversidade/unidade" (Nicolescu).


Nenhum comentário: