sábado, 26 de dezembro de 2009

CONCURSO PÚBLICO E DESVIO DE PODER

- A Carta Cidadã Republicana de 1988 tem como seu farol norteador os valores da liberdade e da igualdade entre todas as classes sociais. Seguindo esses valores e vários outros princípios constitucionais, o verdadeiro Estado de Direito tem a necessidade premente de buscar, para as atividades-fins, por meio de concurso público, aqueles que sejam os mais capazes profissionalmente para ingressar em uma carreira pública.

- Outrossim, as atividades que pertençam às categorias funcionais, como por exemplo, enfermeiros, que sejam abrangidas por plano de cargos do órgão ou entidade não poderão ter empresas terceirizadas nessas atividades-fins, quando o Administrador Público tiver a sua disposição concursados em um cadastro reserva ainda válido.

- Como já não vivemos em um regime autoritário ou uma monarquia corrupta onde o valor da liberdade e da igualdade seriam moedas enferrujadas e sem valor, a regra para a investidura em emprego público ou cargo fica harmonicamente atrelado ao concurso público de provas ou de provas e títulos conforme prescreve o art. 37, II da CF/88. Pelo menos deveria de ser assim na Republica Federativa do Brasil que segundo a Carta Cidadã é um Estado Democrático de Direito.

- No entanto, verifica-se que em muitos Estados da federação brasileira, incluindo-se, obviamente, o Estado de Roraima, muitos administradores públicos passam ao largo da determinação constitucional, não seguindo todas as regras e princípios constitucionais para o ingresso em cargo ou emprego público.

- Sendo assim, alguns dos princípios constitucionais da Administração Pública Brasileira, cujas letras iniciais de algumas formam a palavra “LIMPE”, ou seja, os princípios da LEGALIDADE, da IMPESSOALIDADE, da MORALIDADE, da PUBLICIDADE e da EFICIÊNCIA, acabam por ser ignorados por vários administradores públicos de inúmeros Estados federativos e Municípios.

- Em alguns casos é gritante o desrespeito as normas constitucionais, quando o Estado/Município mantém, a título precário, em seus quadros, centenas de profissionais não concursados, os quais estão a ocupar os cargos públicos, prejudicando a população que deixa de ser atendidos por pessoas mais capazes profissionalmente, principalmente quando se tem um cadastro de reserva de aprovados via concurso público sendo ignorado.

- Não obstante, para chafurdar ainda mais os princípios da “LIMPE”, muitos desses administradores tendenciosos, além de manter funcionários temporários em atividades-fins, mesmo com a homologação dos aprovados nas vagas do edital e com um cadastro reserva, continuam solicitando novos profissionais as empresas terceirizadas a qualquer momento demonstrando, claramente, a burla do concurso público, interesses eleitoreiros e outros interesses pessoais.

- Por este caminho injusto e imperfeito, basta que o profissional que almeja determinado cargo tenha uma indicação de algum político. O pior é que muitos desses contratados permanecem dezenas de anos e alguns até mesmo conseguem obter a aposentadoria pelos bons serviços eleitoreiros prestados. Obviamente esses contratados serão sempre submissos as ordens do Rei. Não falam, não enxergam e não ouvem. Uma verdadeira maravilha para o Administrador Público corrupto, o qual os mantém silenciosos e sem qualquer tipo de criticidade. Tudo em prejuízo da democracia, da cidadania e da “LIMPE”.

- Ademais, o lastimável de tudo isto é quando a Administração Pública tem cidadãos aprovados em um concurso público ainda válido e não são convocados para a nomeação e posse, pois os cargos públicos estão sendo ocupados de maneira precária pelos apadrinhados do Rei. Dessa maneira fica evidenciada a necessidade da prestação de serviços em prol do Poder Público. Mais lastimável ainda é ver algumas instituições que deveriam defender os princípios constitucionais da “LIMPE” e outros princípios em um estado de apatia vergonhoso.

- Só para descontrair, soube a poucos dias de uma pessoa que estava prestes a se aposentar, a qual estava enfrentando um pequeno problema burocrático. Estava com dificuldade para legalizar a aposentadoria, pois sempre tinha trabalhado como técnica de enfermagem. Não possuía o certificado e nunca fez qualquer concurso para a área. Simplesmente era a amiga de políticos. Para regularizar essa situação fez um estágio com uma professora de enfermagem de um determinado curso preparatório e o problema foi solucionado. Como num passe de mágica, o certificado estava garantido. Tudo estava regularizado. Aposentou-se. Esse é o quadro de muitos funcionários públicos que nunca fizeram um concurso público, mas ocupam cargos públicos de maneira precária por serem amigos do Rei e até conseguem garantir a aposentadoria.

- Mas, afinal de contas, o que a Justiça do Estado de Direito da República Federativa do Brasil vem fazendo para aqueles brasileiros que não estão dormindo um sono letárgico e recorrem às vias judiciais para salvaguardar os seus direitos de aprovados em um concurso público, principalmente quando o Administrador Público denega a posse e a nomeação, colocando nas vagas os seus apadrinhados? Boas notícias. O Supremo Tribunal Federal vem reiterando o direito líquido e certo para aqueles que provem em suas ações que estão sendo preteridos por empresas terceirizados ou temporários em cargos públicos nas vagas previstas do edital, ou em vagas remanescentes após a posse e nomeação da previsão inicial.

- Destarte, muitos juízes de primeiro grau estão concedendo a Tutela Antecipada contra a Fazenda Pública em ações ordinárias para a posse e nomeação. Mandados de segurança estão sendo impetrados e em caso de negativa da posse e nomeação, buscam o Tribunal de Justiça, pois o direito violado, desde que provado a contratação precária de temporários e que o concurso público seja ainda válido, transforma-se em direito subjetivo.

- De fato, recentemente o Superior Tribunal de Justiça, acertadamente diz que apesar de não ser “... unânime na jurisprudência o entendimento de que os aprovados em concurso público possuem mera expectativa de direito à nomeação; todavia essa expectativa faz nascer direito subjetivo se, dentro do prazo de validade do concurso, surgem novas vagas não previstas no edital” (STJ-ROMS15180/PR-DJ 06-10-2003, p. 328)

- Nesse sentido, os aprovados em concurso público do cadastro de reserva, devem de ter a plena consciência de que o Administrador Público, com algumas exceções, na maioria das vezes, erra de maneira intencional ao colocar terceirizados nos cargos públicos, tendo a sua disposição um cadastro de reserva de aprovados em um certame. Tal fato nefasto configura desvio de poder ou desvio de finalidade e deve de ser combatido via judicial.

- O conceito do desvio de poder foi bem evidenciado pela jurisprudência francesa, revelando a primazia do interesse pessoal do Administrador Público, obviamente com grandes prejuízos para o verdadeiro interesse público.

- Vale ressaltar, que ainda acredito que o concurso público é também um dos meios para se promover muitos dos princípios constitucionais do nosso Estado de Direito. Os interessados nos cargos públicos são escolhidos por seus méritos e capacidade nas provas ou provas e títulos e não por serem compadrados de políticos oportunistas e corruptos, os quais chafurdam a Nação brasileira. Estes sim procuram manter velhos paradigmas monárquicos, os quais mantêm a corrupção ativa e entravam a Administração Pública com funcionários terceirizados, que se perpetuam no tempo, em uma verdadeira zombaria aos princípios e doutrina constitucionalista da Lei Maior.

- E, para finalizar, fico preocupado ao ver, em meu Estado, dezenas de pessoas aprovadas em concurso público aguardando a posse e nomeação, enquanto a discricionariedade do Administrado Público extrapola os limites da lei e chega até mesmo, através de uma empresa terceirizada, a qual recebe mais de R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais anuais) do erário público, a colocar os próprios aprovados do cadastro de reserva nas vagas públicas, além de pessoas vindas de outros Estados da federação, as quais, muitas vezes, indicadas por alguém. Mais preocupado, fico ainda, ao ver que grandes partes dos cidadãos aprovados não acreditam na justiça, não possuem um senso de cidadania desenvolvido e aceitam placidamente as migalhas fornecidas pelos poderosos da região, em um verdadeiro escárnio a Carta Cidadã de 1988 e a própria democracia, a qual vai, paulatinamente, se tornando imperfeita, corrupta e com maravilhosos meios sutis de controle das massas ignaras, além da impunidade generalizada dos maus políticos despossuídos de ética e moral.

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